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Desenvolvimento da personalidade: criação ou natureza?

Se o primeiro ano de vida da criança é marcado por uma capacidade incrível de aprendizado e muita fofura, o segundo ano nos revela crianças cheias de temperamento e vontades. A curiosidade acerca do desenvolvimento da personalidade dos bebês já motivou inúmeros experimentos científicos, e as respostas não são simples, mas são de encantadoras.

Aqui, vamos falar de pelo menos 3 determinantes da formação do gênio dos pequenos: a natureza humana, a genética e, claro, a criação oferecida pelos pais. Você vai entender como esses aspectos se somam, nos dando a habilidade incrível de cooperar, sermos altruístas e prestativos.

A gente promete: depois deste post, você vai pensar duas vezes antes de jogar a culpa nos signos. Boa leitura!

Quando se inicia o desenvolvimento da personalidade?

Não é novidade que os bebês, em sua mais tenra idade, têm dificuldade de se enxergarem como indivíduos separados do outro. Assim, a mãe é entendida como uma extensão de si, e é bastante complicado falar em personalidade nessa fase.

Durante um tempo, a ciência considerou o “teste do espelho” como um indício de que a criança finalmente havia tomado consciência de si. Para passar no teste, o bebê é marcado de alguma forma, com batom nas bochechas, por exemplo, e colocado em frente ao espelho. 

Ao ver seu reflexo, a criança tende a tocar a marca, demonstrando que houve um reconhecimento de si no espelho, e que a imagem especular não foi entendida como sendo outra pessoa. Em média, os bebês tendem a passar no teste com 18 meses de vida. Isso não significa, todavia, que eles não tenham nenhuma noção de quem sejam antes dessa idade.

Isso porque a forma como se movimentam já nos primeiros meses de vida já não é totalmente aleatória. Só para ilustrar: quando tentam alcançar objetos ou quando seguem pessoas com o olhar, girando a cabeça, os bebês estão tentando antecipar a trajetória daquilo que enxergam. Aqui, os pequenos estão começando a construir uma consciência do corpo como entidade funcionante no mundo. Esse parece já ser o início de uma autoconsciência.

A prova disso tudo é o resultado de uma pesquisa da Universidade de Emory que indicou que, aos 4 meses de idade, os lactentes já apresentam sinais de discriminação entre si e o outro em imagens especulares. Aos 9 meses, por sua vez, eles começam a entender os outros como agentes intencionais de comunicação, e tendem a se engajar e a se interessar mais pelo interlocutor do que pela própria imagem.

De onde vem o temperamento?

Se você espera uma resposta simples do tipo “é genético” ou “é criação”, esqueça. Tampouco vai rolar de jogar a culpa nos astros. A verdade é que o temperamento, traço mais precoce da personalidade, é uma linda mistura entre todos esses elementos, mas como é possível analisar isso nos bebês?

O King’s College London fez um estudo gigantesco para tentar explicar por que alguns bebês são mais risonhos, outros mais tímidos ou deprimidos. Para isso, eles acompanharam desde 1994 até os dias atuais mais de 16.000 pares de gêmeos idênticos e não idênticos. O objetivo era entender os papéis dos genes e do meio ambiente na formação da identidade.

Nesse contexto, o estudo em gêmeos idênticos é ideal, porque tratam-se de indivíduos 100% iguais geneticamente, assim, é possível isolar o papel do ambiente. Dessa forma, foram avaliados medo, raiva, nível de atividade, sociabilidade, timidez e impulsividade, assim como problemas comportamentais, cognição e conquistas escolares.

E o resultado? Bem, gêmeos idênticos são sempre mais parecidos entre si que gêmeos não idênticos, e isso comprova o papel da genética na determinação de parte do temperamento infantil, do desenvolvimento da personalidade. Quando falamos em determinação genética, contudo, estamos falando de milhares de genes. Nem dezenas nem centenas, milhares. Existe, portanto, uma classificação poligênica capaz de predizer os traços psicológicos de cada um de nós. Incrível, não é?

O papel da criação

O temperamento tem a ver com a capacidade de um indivíduo de reagir emocionalmente a uma situação, e com a sua habilidade em modular essa resposta. Historicamente, a psicologia falava em 3 categorias de temperamento: bebês difíceis, fáceis ou lentos. Acreditava-se, então, que essas características corrigiam com o tempo. 

Atualmente, no entanto, acredita-se que o temperamento não é algo que se corrige com o tempo, mas sim algo que se desenvolve com o tempo. Tendo isso em vista, a Universidade de Washington fez uma série de experimentos, avaliando a expressão facial, corporal e verbal de mães brincando com seus bebês. A intensidade da brincadeira, assim como os gestos e a reciprocidade mãe-bebê foram mensurados.

Em uma segunda etapa, foi avaliada a resposta dessas crianças ao serem confrontadas com máscaras que representavam para elas 4 faces desconhecidas. Isso foi repetido aos 4, 8, 10 e 12 meses de idade. A reação dos bebês, como arregalar dos olhos, elevação da sobrancelha, e outras atitudes como choro, tremores e virar-se em direção à mãe também foi quantificada.

Concluiu-se, então, que entre 8 e 10 meses havia um grande aumento da resposta relacionada ao medo. Isso não é à toa: é nessa fase que as crianças têm mais mobilidade, e tendem a encontrar mais ameaças nos ambientes que passam a explorar. Sob essa ótica, a hipótese de que o temperamento seria moldado pelo tempo faria sentido. 

Quando os dados infantis foram confrontados com os dados maternos, no entanto, percebeu-se que crianças que tinham mães mais responsivas e sensíveis durante as brincadeiras chegavam aos 6 meses de idade com resposta relativa ao medo diminuída. Ficou comprovado, assim, que a interação dos pais com as crianças também é capaz moldar o desenvolvimento da personalidade.

Sem determinismos

Embora estejamos aqui elencando fatores que moldam o desenvolvimento da personalidade, é preciso saber que as coisas não são assim tão exatas. O temperamento do seu bebê sofrerá influências da escola, dos amigos e de muitos outros fatores que ainda estão por vir. 

De fato, as evidências sugerem que existem, sim, ligações significativas entre nossas tendências comportamentais de quando temos apenas alguns meses e nossa personalidade posterior. Mas, isso não quer dizer que a personalidade do seu filho seja rígida e imutável. 

Ou seja, se você tem uma criança difícil ou tímida não significa que ela será também um adulto com essas características. A verdade é que as crianças são plásticas, e também há espaço para a mudança no que diz respeito ao temperamento. Por isso, a nossa mensagem é: identifique os traços mais significativos da personalidade do seu filho, e ofereça a ele as ferramentas necessárias para que suas respostas afetivas sejam adequadas frente às situações.

Só para ilustrar: se você tem uma criança tímida, não a deixe sozinha com outras crianças em uma festinha, vire as costas e saia de perto. O ideal é ficar ali com ela um tempo, apresentá-la às outras crianças e mediar a interação, para que ela se sinta segura e à vontade. 

Outro exemplo: uma criança que está mais no espectro estressado de temperamento, deve ter uma rotina bem previsível. Estabeleça um horário para dormir, um horário para acordar e um horário para a soneca. Determine também, por exemplo, onde cada uma dessas atividades deve acontecer. Isso vai ajudá-la a ter respostas menos exacerbadas.

O que a natureza humana tem a nos dizer sobre isso?

É impossível falar do desenvolvimento da personalidade sem falar em sociabilidade. Nós, seres humanos, temos a incrível capacidade de cooperar, de nos associar e de aprender com os outros. De onde vem isso?

Durante muito tempo, acreditou-se que os bebês não fazem ideia do que se passa na mente daqueles com quem se relaciona, o que não é verdade. Um estudo da Universidade de Berkeley mostrou que crianças a partir dos 18 meses de idade são capazes de entender que os outros podem desejar coisas diferentes daquelas que elas mesmas desejam. Não só isso, mas elas parecem gostar de oferecer aos adultos experiências que os agradam, porque gostam de ver o outro feliz. 

Ademais, experimentos também mostraram que as crianças pequenas não precisam ser ensinadas a serem altruístas, contrariando a ideia de que elas seriam egoístas por natureza. Nesse sentido, concluiu-se que elas gostam de cooperar e que o fazem, sobretudo, quando percebem que o outro precisa delas para resolver um problema.

Esses mesmos experimentos foram realizados em chimpanzés, que compartilham conosco o seu último ancestral. O resultado nos bichinhos foi similar ao dos bebês, confirmando o papel da natureza nesse comportamento altruísta. 

Resumindo…

Decerto, não há resposta fácil ou exata quando o assunto é desenvolvimento da personalidade. Aparentemente, a própria natureza tratou de nos carimbar com uma capacidade incrível de entender o outro, de sentir vontade de ajudar e de fazê-lo, mesmo sem receber nenhum incentivo para tal. Não fosse por essa habilidade, jamais teríamos constituído uma sociedade tão complexa.

Há, ainda, o papel da genética no temperamento, o que torna cada bebê um serzinho especial à sua maneira. Finalmente, a criação vem como a cereja do bolo: a forma como você reage, acolhe, protege e até mesmo os ambientes aos quais expõe seu bebê terão influência em seu temperamento.

Se você tem uma criança geniosa em fase pré-escolar ou escolar e não está sabendo lidar com isso, confira nosso post: Terapia cognitivo-comportamental em criança: funciona mesmo? 

Noeh, tecnologias para cuidar da vida!

Espero que tenham gostado! Se tiver dúvida é só perguntar!

Um abraço apertado, com carinho da Noeh

 

  1. Child Development, January/February 2002, Volume 73, Number 1, Pages 35–46. Who’s in the Mirror? Self–Other Discrimination in Specular Images by Four- and Nine-Month-Old Infants
  2. Clues to your personality appeared before you could talk. BBC.
  3. Bebês em foco: Documentário produzido por Netflix.
  4. Rimfeld, K., Malanchini, M., Spargo, T., Spickernell, G., Selzam, S., McMillan, A., Plomin, R. (2019). Twins Early Development Study: A Genetically Sensitive Investigation into Behavioral and Cognitive Development from Infancy to Emerging Adulthood. Twin Research and Human Genetics, 22(6), 508-513. 
  5. Gartstein MA, Hancock GR, Iverson SL. Positive Affectivity and Fear Trajectories in Infancy: Contributions of Mother-Child Interaction Factors. Child Dev. 2018;89(5):1519-1534. doi:10.1111/cdev.12843
  6. Repacholi, Betty & Gopnik, Alison. (1997). Early Reasoning About Desires: Evidence From 14- and 18-Month-Olds. Developmental psychology. 33. 12-21. 10.1037/0012-1649.33.1.12. 
  7. Warneken, F. (2013). The Development of Altruistic Behavior: Helping in Children and Chimpanzees. Social Research: An International Quarterly 80(2), 431-442.
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