Quando o bebê começa a ouvir? A ideia de que o útero funciona para o feto como uma caixa fechada ao longo de toda a gestação, e de que os nenéns nascem, como dizia Locke, “tábula rasa” já caiu por terra há algumas décadas. Hoje, sabemos que a criança está em interação com o meio externo desde a vida intrauterina e que, quando vem ao mundo, já tem até uma certa bagagem de vivências.
Estudos a respeito do psiquismo fetal vêm reforçando que os recém nascidos possuem preferências sonoras, visuais e olfativas. Além disso, eles parecem memorizar a voz da mãe e reconhecer melodias.
Na leitura de hoje, você vai descobrir por qual motivo é importante estimular o feto a partir do último trimestre da gestação, quando o bebê começa a ouvir e como isso pode influenciar em sua personalidade e desenvolvimento.
O feto percebe o mundo externo
Consideramos como estágio fetal o período que vai do início da nona semana de gestação até o nascimento do bebê. Já no 3º mês o feto adquire forma evidentemente humana, seus hemisférios cerebrais crescem e são formadas outras partes importantes do sistema nervoso central, como o cerebelo e as primeiras conexões entre neurônios (sinapses).
No fim deste período ele já é capaz de fazer diversos movimentos, como chutar, abrir e fechar as mãos e a boca, além de deglutir. Por volta da 20ª semana, ou 5º mês, é quando o bebê começa a ouvir. Apesar disso, ele só é capaz de processar sons de baixa frequência, e essa função vai se aperfeiçoando conforme a gestação avança.
No sexto mês os olhos estão formados e capacitados a olhar em todas as direções. O sistema nervoso também está bem mais maduro a partir da 24ª semana. É aqui que ocorre a mielinização, isto é, os neurônios ganham uma bainha gordurosa ao longo de seus axônios, o que confere agilidade à condução dos estímulos.
Reta final
O sétimo mês marca a reta final da gravidez. Aqui, o feto já é capaz de diferenciar estímulos luminosos que determinam o dia e a noite, além de ser capaz de ver o contorno do seu próprio corpinho e do cordão umbilical. Estima-se que nessa fase ocorra o desenvolvimento de uma consciência de si e do mundo exterior, e que o feto passe a demonstrar maior interesse pela voz da mamãe.
Durante toda a gestação o feto está amadurecendo embebido por um meio que também é influenciado pelas alterações de pressão arterial da mãe, liberação de hormônios e outros estímulos, como traumas ou carícias. Assim, nenhum bebê está sujeito a condições idênticas entre si, dadas as particularidades do ambiente ao qual cada gestante está vulnerável.
O feto possui vida emocional
Ao contrário do que muita gente pensa, o feto tem sim uma vida emocional antes de vir ao mundo. Aliás, ele é extremamente sensível e alguns traços de sua personalidade podem já ficar evidentes até mesmo na forma como se mexe dentro da barriga.
Maíra dos Santos Jaber, em sua tese, mostrou que a condição afetiva do feto está diretamente relacionada ao estado emocional da mãe e como ela se dispõe em relação ao filho. Nas palavras dela, “o feto é capaz de sentir prazer, dor, tristeza, alegria, medo, bem-estar, angústia e de captar os estados emocionais da mãe”.
Isso acontece porque, ao experimentar os mais diversos tipos de sentimentos, o sistema nervoso da gestante lança neurotransmissores em sua corrente sanguínea, e essas substâncias são capazes de atravessar a barreira placentária. Mas, calma, você não precisa se preocupar em excesso. Esses estímulos só são realmente nocivos quando são muito frequentes.
Uma mulher, por exemplo, que está constantemente sobre estresse ou que possui um quadro de depressão prévio à gestação poderá manifestar mediadores químicos e inflamatórios que são transmitidos ao bebê.
De acordo com um estudo publicado no Journal Psychoneuroendocrinology, esses estímulos químicos podem provocar sofrimento fetal, limitação de crescimento ou influenciar no comportamento do neonato, em sua relação afetiva com a mãe e em sua capacidade de organização cognitiva. Se esse é o seu caso, não deixe de conversar com seu obstetra e manter o acompanhamento da saúde mental em dia, certo?
Bebês aprendem por meio do som ainda na barriga
A técnica de imagem do ultrassom nos permitiu conhecer um pouquinho da interação de bebês intraútero com o mundo externo, mas essa não foi a única tecnologia a nos ajudar nessa tarefa. O advento do hidrofone, um pequeno microfone capaz de captar som em meio aquoso, nos revelou um ambiente sonoro jamais antes imaginado dentro do útero.
Descobrimos, então, que a playlist do bebê é composta pelo som dos batimentos cardíacos, fluxo sanguíneo, dos movimentos peristálticos e da respiração da mãe. Mais que isso: ele também é capaz de ouvir sons provenientes do meio externo, inclusive a voz da mãe e de outras pessoas, ruídos do ambiente, da marcha da mãe e, pasmem, música!
De acordo com o livro “O que é música?” de Jota Moraes, a transmissão do som pode se dar por meio do tato, via condução óssea, e por meio da audição, pela via aérea. É claro que o som externo não é percebido pelo feto da mesma forma que é percebido por nós, já que ele precisa atravessar diversas barreiras físicas em seu trajeto.
Que som o baby reconhece?
Estima-se que essas barreiras prejudiquem acusticamente o ruído e distorçam, por exemplo, o som das consoantes. Já as vogais, o tom da fala e as melodias musicais parecem ser bem reconhecidas a partir do 6º mês, embora alguns pesquisadores acreditem que isso só ocorre por volta da 32ª semana.
O fato é que, a partir do 6º mês de vida, você pode e deve conversar com seu bebê, colocar música para que ele ouça, além de estimulá-lo pelo toque e com carícias no barrigão. Ao tocar ou massagear a barriga, as vibrações causadas no líquido dentro do útero proporcionam ao feto também uma experiência tátil. Não se esqueça: o papai deve participar desses momentos. Assim, quando o bebê começa a ouvir a voz dos pais fica mais fácil criar vínculo e reconhecer semelhanças no período pós-natal.
Bebês são capazes de reter memória da vida intraútero
Um experimento feito por Decasper & Spencer (1986) levantou a hipótese de que, sim, nossos bebês retêm memória da vida dentro da barriga. Os pesquisadores pediram a algumas gestantes que, aos sete meses e meio de gestação, gravassem com sua própria voz três pequenas histórias infantis. Apenas uma dessas histórias deveria ser lida para o bebê em todos os dias das últimas 6 semanas de gravidez.
No período pós-parto, essas mulheres tiveram um dispositivo acoplado às mamas, que permitia ativar a gravação das histórias de acordo com o ritmo de sucção da criança no peito. Se a sucção fosse rápida, a história escolhida pela mãe durante a gestação era ativada; se fosse lenta, uma das histórias não escolhidas era reproduzida.
O resultado? Bem, ao que tudo indica, os pequeninos sugavam mais rápido para ouvir as histórias com as quais tinham familiaridade, sugerindo algum tipo de memória da vida intraútero.
É ou não é a coisa mais linda a forma com mãe e bebê estabelecem um vínculo progressivo durante a gestação? Com a gigante contribuição da ciência, acabamos descobrindo você pode investir na relação com seu bebê mesmo antes de ele chegar, além de oferecer substrato extra para seu futuro interesse pelo mundo aqui de fora.
E aí, como você tem se comunicado com seu bebê? Comente no post contando para a Noeh como tem sido sua experiência!
Noeh, tecnologias para cuidar da vida!
Espero que tenham gostado! Se ficou dúvida é só perguntar nos comentários!
Um abraço apertado, com carinho da Noeh
Referências:
- Prenatal maternal speech influences newborns’ perception of speech sounds. Infant Behavior and Development. Volume 9, Issue 2, April–June 1986, Pages 133-150
- Fetal reactions to recurrent maternal speech. Infant Behavior and Development. Volume 17, Issue 2, April–June 1994, Pages 159-164
- Livro: O que é Música? Jota de Moraes
- Antenatal depression programs cortisol stress reactivity in offspring through increased maternal inflammation and cortisol in pregnancy: The Psychiatry Research and Motherhood – Depression (PRAM-D) Study | Psychoneuroendocrinology. 2018 Dec; 98: 211–221.
- O BEBÊ E A MÚSICA. Sobre a percepção e a estruturação do estímulo musical, do pré-natal ao segundo ano de vida pós-natal. Maíra dos Santos Jaber, UFRJ